"Eu nunca tinha ouvido falar de Ademir Junior, daí minha estupefação já na primeira faixa do seu já quinto (!) álbum gravado. A experimentação de
ouvir alguma coisa inesperadamente rica e bela foi, sobretudo, um gesto de humilde reconhecimento diante da minha ignorância quanto à sua existência.
Ora, mas assim é a música instrumental brasileira: uma legião de grandes músicos, como que condenados ao exílio em sua própria terra.
Parecendo forçados ao anonimato, eles buscam, a todo custo, fazerse ouvir. Missão ingrata, posto que desde sempre é quase impossível entregar sua musicalidade aos que certamente gostariam de ouvilos.
Ademir Junior é saxofonista e clarinetista. O amor pelos dois instrumentos o levou a dedicarse a eles desde cedo. Seu sopro é coisa vital, que desliza que é uma beleza.
Para gravar Sensações (independente), ele arregimentou uma banda que, além do seu sax tenor e de sua clarineta, contou com o trompete de Moisés Alves, a guitarra de Alex Carvalho, o piano elétrico de Marcelo Corrêa, o baixo elétrico de Hamilton Pinheiro, a bateria de Guilherme Santana e a percussão de Carlos Pial.
Instrumentistas que se jogaram nos braços dos ótimos arranjos escritos por Ademir para os dez temas de sua autoria. Essencialmente um álbum de jazz, os arranjos são uma quebradeira esperta. Muitos dos temas são levados num andamento ligeiro, o que resulta em improvisos e grooves entusiasmantes.]
Sensações é como um vendaval que joga o ouvinte contra a parede, impedindo que sua respiração flua, quase sufocando, mas ele não está nem aí para tal sufoco, pois o que pretende mesmo é se deixar dominar por tamanho patrimônio musical.
Quando o tema tem um andamento mais suave e a quebradeira dá vez ao lirismo, ouvemse igualmente harmonias sempre muito bem elaboradas e melodias concebidas com admirável fortuna criativa.
O CD abre com Nativos (AJ), que tem introdução plena de suingue e abraseada pelo naipe de sopros. O sax sola, e a profusão de notas emitidas é a senha para que o ouvinte seja arremessado à parede pela primeira de tantas vezes ao longo da audição. O andamento é acelerado.
Tendo baixo, piano, guitarra e bateria a amparálo, o trompete se desgarra e puxa a melodia para frente, enquanto uma célula de notas repete um desenho de notas. Volta o naipe de sopros. Brusca mudança de levada, dá vez ao piano que toca levemente, arritmo.
A batera trisca os pratos. O baixo e o piano preparam o retorno do sax, que torna a solar – Ademir é o rei do improviso! A quebradeira volta... Fim.
Deus do céu! A oitava faixa é Xote Candango (AJ). Pelo acordeom de Junior Ferreira, em participação especial, o xote vem gostoso. É o Nordeste impregnando o trabalho de Ademir Junior.
O CD fecha com Tributo MB, homenagem de Ademir ao saxofonista Michel Brecker. O tema, uma balada lenta, tem a boniteza do homenageado, a quem ele sempre viu como exemplo. Belo modo de fechar um disco instrumental da mais alta estirpe."

Aquiles Rique Reis